Jornalistas executam suas funções em terreno hostil

Jornalistas executam suas funções em terreno hostil

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Ataques e censura aos profissionais de imprensa crescem no Brasil, principalmente às mulheres jornalistas na internet. Realidade também é vivida pelas profissionais do meio rádio.

Por Fernanda Nardo


As mulheres conquistaram cada vez mais espaço profissional e destaque em suas respectivas áreas. Mas ainda existem muitos desafios nessa caminhada e os avanços são ainda mais lentos se não houver conscientização e respeito. Para se ter uma ideia do problema, as mulheres jornalistas em exercício da profissão são vítimas de mais da metade dos casos de ataque a jornalistas no ambiente virtual. As profissionais recebem mais insultos e ameaças do que os homens, apenas pelo fato de serem mulheres.

No ano passado foi registrado um alto número de ataques à liberdade de imprensa. Segundo um levantamento feito pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), foram 367 casos. Destes, 17% atingiam diretamente o público feminino. Mas quando se trata do ambiente virtual, 56,76% das vítimas eram mulheres. Os números seguem aumentando.

Em janeiro deste ano, a Abraji registrou um total de 26 ataques a jornalistas e veículos de imprensa – no mesmo período de 2020, foram 11.  A violência é uma maneira de silenciar as pessoas, negar-lhes a voz e reduzir a credibilidade. Diferente dos ataques sofridos por jornalistas homens, os ataques destinados às mulheres se somam a xingamentos machistas e integram campanhas para desqualificar o trabalho das profissionais.

É o caso da jornalista e colunista do UOL, Juliana Dal Piva, que sofre com ataques pela internet há mais de três anos. Ela conta que as agressões virtuais se intensificaram após uma cobertura política em que citava a família do presidente Jair Bolsonaro. Segundo a jornalista, após a matéria ser repostada com comentários do vereador Carlos Bolsonaro, veio uma enxurrada de ataques misóginos.

“Logo depois que ele colocou nos stories dele iniciaram os ataques contra mim. Como não havia muito a comentar sobre a matéria em si, eles só vinham para falar mal mesmo. Xingamentos de caráter misógino e com ofensas sem nenhum pudor”, afirma.

Para Juliana, lidar com esses tipos de ofensas se tornou corriqueiro. “Esse tipo de situação já me atingiu mais emocionalmente. Hoje em dia, quando vejo esse nível, eu bloqueio para não me desgastar. Mas não podemos naturalizar esses comportamentos. É sempre mais forte e ofensivo contra jornalistas mulheres e também contra profissionais gays”, afirma.

Do virtual para o rádio

Ao longo dos seus 18 anos de rádio, a psicóloga e âncora da Rádio Transamérica Light, Maria Rafart, diz já ter sofrido diversos ataques e intimidações. Ela relata uma situação em que o ataque iniciado no ambiente virtual ganhou contornos na vida real, quando um homem que já fazia ameaças por mensagens invadiu o estúdio de gravação.

“Ele estava alterado, exigia que eu falasse coisas no ar e chegou a arremessar um copo com água na parede. Depois de muita conversa o homem deixou o estúdio, mas quando estava na porta colocou a mão no bolso da jaqueta – todos ficaram paralisados – , tirou um CD do Coral de Santa Felicidade e me entregou, acredita nisso?”

A apresentadora foi à delegacia e descobriu que essa mesma pessoa atacava diversos jornalistas que não colaboraram com um blog que ele mantinha e que foi tirado do ar. “Naquele dia ele saiu da rádio e ficou escrevendo nesse blog barbaridades sobre mim, inclusive, ataques de cunho sexuais extremamente agressivos”, relata.

Maria Rafart acredita que o comunicador por estar mais exposto acaba passando por esse tipo de situação. “Mas a ameaça sexual sempre foi masculina”.

Por que a reação contra as mulheres é sempre mais violenta?

Esse é um fator histórico, afinal o lugar do homem sempre foi o espaço público, enquanto o da mulher, o ambiente privado. A advogada, psicóloga e escritora, Tais Martins, recorda que historicamente a mulher foi restrita à questão da maternidade, mas como nós já sabemos não é assim que as coisas funcionam hoje.

“Essa mulher busca um lugar. Mas a sociedade segrega e outorga à mulher muitas responsabilidades, fazendo com que ela não tenha esse lugar. Ou seja, a mulher busca ser protagonista da sua própria história, das suas escolhas, enquanto a força masculina tenta manter a mulher como coadjuvante do seu próprio enredo”, diz.

Para Tais, essa hostilidade, dentro e fora da internet, em relação às mulheres é a conotação de que o público feminino não tem a competência e nem o “direito” à igualdade e, inclusive, o direito de ocupar seu lugar.  “Por isso, as críticas não têm a ver com competência da mulher apenas, mas ao fato de ser mulher. Na sociedade em que vivemos a mulher tem que perder, porque o homem é mais “forte”, “inteligente” e mais “competente”, afirma.

Quando falamos da mulher jornalista, é importante lembrar que as violações às liberdades garantidas à profissão se somam às diversas formas de violência ao público feminino no espaço social.  A internet apenas ampliou e facilitou a agressão direcionada às mulheres, que se tornaram alvos mais recorrentes desses ataques.

Material de apoio

Algumas entidades de jornalismo lançam materiais para auxiliar, dar suporte, além de formar redes de apoio coletivas aos profissionais de comunicação, inclusive, com recorte de gênero e raça.

Como a Rede de Jornalistas e Comunicadoras com visão de Gênero e Raça, (clique aqui).  Além do material de apoio psicológico publicado pelo Commitee to Protect Journalists (CPJ), acesse a lista.

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