Por que estamos tão intolerantes?

Por que estamos tão intolerantes?

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Especialista aponta como a principal causa da intolerância a falta de empatia, que pode levar ao medo daquilo que é diferente de nós.

Por Fernanda Nardo


Uma das grandes lições trazidas pelo isolamento social foi a importância das relações, do outro em nossas vidas. Mesmo vivendo em uma cultura pautada no individualismo, não há como negar que somos um produto do coletivo, influenciamos e somos influenciados pela sociedade. No entanto, quando o outro reflete algo que não me agrada, vem a intolerância e o conflito.

Grande parte dos conflitos vem da negação do outro, seja nas relações íntimas, de trabalho, raciais, de gênero, política ou religiosa. No dicionário, a intolerância é descrita como: ausência de tolerância ou falta de compreensão, comportamento ou atitude odiosa e agressiva a diferentes opiniões. Ou seja, a intolerância tem múltiplas faces e se expressa por meio do medo do diferente.

“Aponto como a principal causa da intolerância a falta de empatia, que em alguns casos pode levar ao medo daquilo que é diferente de nós. Historicamente, o homem sempre tratou o diferente com preconceito e intolerância”, diz o filósofo e cientista político, Marlus Forigo. 

Para o psicólogo e coordenador do Curso de Psicologia da FESP, Fabiano de Mello Vieira, o convívio com as diferenças sejam elas de opinião ou de qualquer outro aspecto é, possivelmente, um dos maiores desafios que um ser humano pode enfrentar.

“Lidar com a diferença exige um movimento de alteridade que implica, necessariamente, um “abandono de si”. Em consequência, “abandonar” por um instante a si mesmo coloca o sujeito em contato com a sua própria fragilidade. Assim, para se defender desse abandono o indivíduo se mostra intolerante em relação à diferença própria do outro”, explica.

Mas será que estamos mais intolerantes do que nunca? A intolerância sempre existiu. No entanto, o surgimento e o crescimento das redes sociais deram voz ao que temos de melhor e pior. De acordo com Forigo, a internet facilitou e possibilitou que pessoas intolerantes se organizem e legitimem o seu comportamento. “Uma coisa é o indivíduo sozinho, ele tende a se conter, mas em grupo a pessoa se sente mais justificada e segura em relação às suas opiniões”, destaca.  

Segundo Vieira, é como se alguém assinasse embaixo daquilo que a pessoa sempre pensou e a internet só vai fazer o trabalho de propagar. Entretanto, a ausência de senso crítico é o que torna tudo mais complicado.

“Sempre existirão pessoas dispostas a utilizar os mecanismos de comunicação como forma de controle e manipulação. Caberá ao sujeito definir a maneira como utilizará essa informação”, diz o psicólogo.

Fake news e intolerância generalizada

Controle, manipulação e distorção de informação, vivemos uma onda de notícias falsas que demonstram intolerância social generalizada. Estamos sofrendo hoje com o que a UNESCO intitulou de “desiinfodemia”, uma onda paralela a pandemia, que tem semeado confusão sobre escolhas que impactam diretamente na saúde e podem salvar vidas.

Para o professor Forigo, as fake news são um exemplo da discursividade de um intolerante, alguém que demonstra não estar preocupado com a verdade. “A intolerância é uma forma de violência contra outro ser humano, é uma maneira de atentar contra os direitos humanos e a democracia. Eu não vejo outro caminho que não seja o de tratar a intolerância com o rigor da lei, pela violência que ela representa’, diz. 

Construindo pontes

Como a indiferença acaba sendo o medo de lidar com aquilo que é diferente, vale ressaltar que para o outro, nós somos o diferente. Neste entendimento, o mais aceitável seria pelo menos respeitar a opinião alheia, afinal, também queremos respeito. Para que isso aconteça, o primeiro passo é agir com mais empatia. Mas só isso não basta. É preciso, também, abandonar o lugar da verdade e da certeza e dar lugar à crítica.

“A necessidade de forçar o outro a acreditar na minha verdade remete à minha própria insegurança em relação àquilo. Precisamos sempre de bons argumentos, de uma comunicação não violenta e uma capacidade de mergulho na negatividade própria de toda e qualquer relação com o outro”, destaca o psicólogo. 

Ou seja, a comunicação é sempre o melhor meio de lidar com as divergências para que seja possível construir pontes e não muros. “Para isso, preciso me reconhecer como incompleto e desbravar esse caminho com o outro que, na mesma condição de incompleto, se presta à empreitada. Uma boa dose de ignorância (no melhor dos sentidos) é condição para aquilo de bom que o debate pode trazer”, afirma o professor Vieira.

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