Jornalismo: mediação e diálogo em tempos de polarização

Jornalismo: mediação e diálogo em tempos de polarização

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Transparência, apuração e empatia são caminhos para fortalecer o jornalismo e comunicar com diversos públicos de maneira construtiva.

Por Fernanda Nardo.


O jornalismo se mostra cada vez mais necessário no momento atual, perante um ambiente polarizado, fechado em bolhas, inundado por inverdades e movido por uma cadeia estruturada com a intenção de descredibilizar o trabalho dos jornalistas e cercear a liberdade de expressão. Diante deste cenário, é fundamental ter como base a transparência, apuração e verificação dos fatos e a capacidade de recuperar a construção do diálogo, algo que está no rádio como essência.

O movimento que descredibiliza os jornalistas têm um impacto muito grande na sociedade, já que o jornalismo é um peso de mediação e de diálogo. Trata-se de um processo no qual comunicadores e audiência irão construir juntos essa relação e diálogo com o acontecimento. “A partir do momento que eu desvalorizo o conteúdo verificado eu passo a acreditar em tudo o que me dizem, eu tiro o valor de um agente das relações sociais que é muito mais importante do que o jornalista: a informação”, destaca a pesquisadora da Universidade Federal de Ouro Preto, Debora Cristina Lopez.

No entanto, essa informação precisa ser verificada, apurada e extremamente transparente. Afinal, para que seja possível auxiliar a sociedade a tomar decisões fundamentadas, separando o que é fato de fake, é essencial que tenhamos notícias legítimas e condições para tornar interessante e relevante aquilo que é significativo, além da disciplina da verificação e transparência, que são a essência do bom trabalho jornalístico.

“A transparência é fundamental ainda mais no momento atual. É importante mostrar qual foi o processo para se chegar a notícia, e não só fazer o levantamento de dados, mas também ter cuidado na apropriação e na análise desses dados. Contudo, os dados não irão funcionar se eu não considerar a aplicação disso ao cotidiano das pessoas, porque é através do diálogo que é possível construir em conjunto conhecimentos e processos de informação”, afirma Débora.

O supervisor de jornalismo da Rádio BandNews FM Curitiba e professor da Universidade Positivo, Felipe Harmata, ressalta que neste momento em que o reino da opinião está cada vez mais forte, uma das grandes funções do jornalismo talvez seja mostrar que existe apuração, que o fato é concreto e tem embasamento na realidade, por mais que as pessoas gostem ou não.

“Eu acho que a essência do jornalismo se fortifica nisso. Se há uma apuração que é inquestionável, dados verificados, é aí que o jornalismo se fortalece novamente.Na minha visão, ser radicalmente transparente é manter e fortalecer a apuração”.

Mesmo com toda transparência, não podemos descartar que a sociedade vive uma crise que afeta vários aspectos como social, político, econômico, e as pessoas acabam voltando-se contra o mensageiro, como se o jornalista quisesse apenas dar informações ruins. 

“Se o cenário é ruim, é preciso ser mostrado com transparência, mas também é preciso mostrar saídas, acho que essa é uma maneira empática de resolver as coisas, é uma sugestão que eu sempre digo que funciona. O problema é o vírus e não quem está noticiando, por isso, a gente precisa trazer causas, consequências e saídas”, diz Harmata.

Criando vasos comunicantes entre as bolhas

Uma das coisas que as plataformas de redes sociais geraram foram as câmaras de eco e o chamado viés da confirmação, o que seria basicamente a tendência de se lembrar, interpretar ou pesquisar por informações de maneira a confirmar crenças ou hipóteses iniciais. Ou seja, na internet as pessoas acabam se relacionando e curtindo postagens de seus “iguais”, ou que confirmem suas visões de mundo. Esse movimento se ampliou para outros meios, e está cada vez mais difícil comunicar para diferentes públicos e romper as chamadas bolhas.

“Um dos grandes pontos para se comunicar entre as bolhas é mostrar que existem outras perspectivas, e que algumas coisas são fatos e outras são narrativas, ou seja, são visões sobre o mundo. Por essência o rádio é um meio que tem a capacidade de trazer diversos públicos, de agregar, ele abrange uma gama de pessoas, e se há algum meio para furar bolhas, esse meio é o rádio”, destaca o professor.

Para ele, um exercício simples para enxergar outras visões é não excluir quem pensa diferente. O segundo ponto é manter-se sempre atualizado. “Ler outros meios de comunicação, blogs, que não tem a ver necessariamente com aquilo que eu penso. A partir disso, você começa a entender como outras bolhas e pessoas pensam, é um exercício que às vezes dói, incomoda, e envolve até desconstruir preconceitos. Mas acho que é uma saída para começar a enxergar soluções em conjunto”.  

Segundo Débora, essa polarização e todas as restrições de relações afetam a todos e fazem com que as relações entre os sujeitos que pensam diferente sejam ainda mais difíceis e agressivas. Por isso, é importante resgatar a capacidade de dialogar, trabalhar a escuta, construir o conhecimento de forma compartilhada, trazendo argumentos de uma forma mais positiva. 

“Não podemos seguir o caminho da intolerância, inverdade e agressividade quando falamos dos meios de comunicação e, principalmente, do rádio que é naturalmente um espaço de diálogo. Quando eu penso numa comunicação baseada no diálogo e no sujeito com quem eu falo, é possível criar esses processos de comunicação. Eu não digo que iremos conseguir romper as bolhas, mas podemos sim criar alguma forma de integração desses grupos que hoje estão tão polarizados”, afirma a pesquisadora.

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